Medicina Tradicional Chinesa com seus fundamentos e a
necessidade de incluí-la na construção da saúde no mundo atual
Dr. Gutembergue Livramento
*Especialista em Medicina
Tradicional Chinesa (China/Brasil/Europa). *Mestre em Medicina e Saúde Humana (Escola Bahiana de
Medicina e Saúde Pública EBMSP).
*Diretor/Presidente do IBRAPEQ (Instituto
Brasileiro de Ensino e Pesquisa em Qigong e Medicina Chinesa).
Com
abundantes fontes de material de ervas terapêuticas chinesas (12.807 tipos) e
mais de 100.000 fórmulas patenteadas, há grande espaço de desenvolvimento para
novas drogas ou produtos de cuidado com a saúde com potencial aumento de
mercado. As drogas naturais representadas pelos produtos médicos chineses têm
começado a se tornar popular no mundo. O volume de negócios anuais ultrapassa a
30 bilhões de dólares, dados de 2008. A estimativa é que o mercado dobre nos
próximos anos. É também uma nova tendência a substituir drogas químicas de
laboratório por drogas naturais, e isto também será um importante valor da MTC
no desenvolvimento moderno.
No
Brasil a ANVISA já busca as formas mais eficazes para a liberação do comércio
da Fitoterapia chinesa. Teremos um movimento contundente da
Farmacologia/Fitoterapia chinesa no Brasil e no mundo. É a mesma tendência
mundial para a regulamentação da Acupuntura que também está em tramitação em
nosso país e estes fatos potencializarão o crescimento da MTC no Brasil e no
mundo. Que as Universidades públicas invistam em pesquisa e desenvolvimento
assim como no ensino da MTC no Brasil e façam parcerias acadêmicas com
efetividade com Universidades chinesas e outras com grande potencial de
conhecimento e formação para o adequado aperfeiçoamento profissional. A maioria
das parcerias feitas hoje em dia entre instituições chinesas e ocidentais
(incluindo brasileiras) apenas beneficiam os cursos de formação com estes
“chamados para conhecer a China” mas, não há grande valor de ensino profundo da
MTC favorecendo basicamente aos alunos conhecerem superficialmente o berço da MTC.
Que possam existir Universidades sérias na formação profissional no Brasil e
termine de uma vez por todas a insanidade e vergonha da guerra de controle da
MTC pelas entidades de classe de conselhos de saúde. É preciso oferecer ao povo
uma MTC de respeito com profissionais muito bem formados. Ainda estamos longe
desta formação adequada, pois, com o controle da formação dos profissionais de
saúde pelos seus conselhos gerou uma colcha de retalhos do conhecimento da MTC
tornando-a frágil. O primeiro passo para reconstruir este conhecimento de forma
eficaz é reconhecer que o conhecimento da maioria dos profissionais do Brasil,
profissionais de saúde e técnicos, está fragmentada e muito aquém da verdadeira
Medicina Chinesa. Creio sinceramente que se deixarmos os interesses financeiros
e de reserva de mercado o Brasil será uma das grandes potencias da MTC no
mundo, desde que seus profissionais decidam buscar um conhecimento sério e
validado em instituições e profissionais que possam realmente oferecê-lo, na
atualidade ainda carente no Brasil. Para exercer uma boa Medicina Chinesa é
importante saber o conteúdo profundo da Medicina Chinesa como é na China há
pelo menos 5.000 anos.
Se houver formação adequada por Universidades
competentes com a regulamentação da profissão no Brasil, como já acontece em
vários países do mundo, na América do sul iniciado o processo pelo Chile e
Argentina, já não mais importará a formação pregressa deste profissional, fato
que ainda hoje é moeda de constrangimento pelos manipuladores separando os
profissionais em técnicos, médicos e profissionais de saúde não-médicos. O Brasil não pode esperar mais sem a
regulamentação profissional para entrarmos em outra era de crescimento para a
MTC. Para isto todos os profissionais, independente de sua origem acadêmica,
precisam se unir para construir este processo sem preconceitos, pois no final o
mais importante será a formação do profissional em termos de Medicina Chinesa
para atender Medicina Chinesa. Para atender Clínica médica ocidental teremos os
médicos ocidentais; para reabilitar função de órgãos, tecidos moles e ossos,
cinesioterapia, posturologia, teremos os fisioterapeutas; para avaliar e tratar
processos dentários teremos os odontólogos; e assim por diante com todas as 14
categorias de saúde; então para tratar tendo como referência a MTC teremos os
profissionais bem formados em Medicina Chinesa. Há espaço profissional para
todos e todos são muito importantes desde quando sejam peritos estudiosos em
sua área de atuação. Assim como as carreiras de saúde no ocidente o
profissional de Medicina Chinesa poderá ser formado do zero de conhecimentos
fazendo toda uma formação independendo sua profissão anterior ou se apenas
começou a se profissionalizar naquele momento. Claro que os cursos de formação em
MTC estarão também ensinando todo conhecimento de Fisiologia médica, anatomia,
biofísica, biologia celular, microbiologia, parasitologia, fisiopatologia,
parasitologia, histologia, pois estes conhecimentos não são somente ocidentais
e sim universais. Não podemos ignorá-los. Assim como um dia os profissionais no
ocidente entenderão que os conhecimentos originados das medicinas orientais,
indígenas, populares regionais, africanas, incas, maias, também são
conhecimentos universais e quebrem o paradigma vigente e comecem absorvê-los,
pois construiremos uma medicina realmente integrada objetivando a cura do SER
quanto aos seus aspectos espirituais, mentais, físicos, celulares e
bioquímicos. Estaremos mais próximos da VERDADEIRA medicina integrada pela
necessidade daquele que busca ajuda. A população de todo o mundo se
beneficiará. Isto é o que importa no final; Poder gerar saúde e bem estar para
TODOS. O conhecimento e atendimento deverá ser multi e transdisciplinar.
Apesar
de buscarmos incessantemente a regulamentação profissional da Medicina
Chinesa/Acupuntura e a construção e fortalecimento dos PNPICS (programas
nacionais de práticas integrativas e complementares) devemos também estar
atentos à formação profissional. Havendo a regulamentação teremos universidades
no Brasil em Medicina Chinesa e Acupuntura assim como o pleno exercício destes
profissionais no SUS. Quem serão estes professores universitários que serão os
responsáveis para esta classe de profissionais? Qual a formação e qualidades
destes? Temo que se as Universidades Públicas montarem estes cursos teremos um
grupo de mestres e doutores, pesquisadores, à frente deste processo. Por um
lado isto é muito bom, mas correremos o risco de imperar o foco do pensamento
clínico e de pesquisa do modelo ocidental que não atende a demanda e
necessidades dos conhecimentos fundamentais da Medicina Tradicional Chinesa.
Por outro lado se estas universidades forem montadas com o dinheiro de
particulares os professores tenderão a seguir o conhecimento da escola que montou
o curso. Hoje no Brasil as escolas têm, em sua grande maioria, um conhecimento
repartido e pouco aprofundado do conhecimento verdadeiro da MTC. Vários
professores com cursos de acupuntura sistêmica, aurículo-acupuntura, acupuntura
abdominal, crânio-acupuntura, fitoterapia, tuina, dietoterapia, Qigong e mais
diversos outros conhecimentos sem um eixo profundo da Medicina Tradicional
Chinesa, pois foi assim que a Medicina Chinesa foi montada no Brasil. Quem
tinha aprendido alguma coisa montava uma escola e chamava um grupo de
professores, também com pouca/alguma informação e assim as escolas surgiram sem
uma raiz adequada de formação e estrutura do paradigma chinês em sua essência.
Os melhores livros somente começaram a chegar a partir dos anos 90 deixando
mais evidente o pouco que se sabia sobre uma aprofundada MTC. No final dos anos
90 grupos profissionais médicos começaram a tentar ludibriar a sociedade
dizendo que na China somente médicos com conhecimentos ocidentais faziam MTC.
Absurdo sabendo todos nós que os fundamentos da MTC se desenvolvem a pelo menos
5.000 anos e o entendimento nosológico ocidental a menos de 200 anos. Chega ser
ridículo.
Desformataram completamente a MTC criando uma acupuntura que não
existia anteriormente, basicamente para tratar dor, sem diagnóstico de
diferenciação de síndromes, mas era (e ainda é) teimosamente oferecida a
sociedade como a única acupuntura válida. Chamada de Acupuntura médica. O que
temos é acupuntura Chinesa com pequenas variações em Japão, Vietnam, Coréia e ampliação
da leitura clássica como a acupuntura bioenergética e outras, e não
reducionismos absurdos desqualificando a essência da MTC como acupuntura
médica, acupuntura fisioterápica, acupuntura odontológica, etc. Não é o fato de
ter uma agulha na mão que faz um profissional acupunturista, mas sim o seu
conhecimento profundo dos alicerces clássicos e tradicionais e discernimento
clínico. O problema é chamar estas aberrações de Acupuntura. Poderá ser chamada
de agulhamento para fins do uso médico ocidental ou algo assim. Mas não teria
marketing, então somos obrigados a ouvir estes absurdos desqualificando a
verdadeira acupuntura.
Houve guerra com outros profissionais taxados por
aqueles como não-médicos e prevaleceu o bom senso em detrimento à intenção de reserva
de mercado atestando o supremo tribunal de justiça no Brasil mantendo o
exercício profissional para todos os profissionais formados em escolas
adequadas. Mas quando se fala em dinheiro e mercado a “guerra” ainda continua
nos bastidores mesmo a UNESCO tendo colocado a Medicina Chinesa/Acupuntura como
patrimônio da Humanidade sendo que nenhuma classe profissional pode tomar para
si seu exercício. Se todos estivessem pensando no bem estar da população
estaríamos todos preocupados na formação profissional de todo praticante da
Medicina Chinesa/Acupuntura, pois a formação pregressa não interfere
positivamente na adequada formação de um profissional da MTC. Já negativamente
é bem provável, pois quanto mais cartesiano, materialista e linear for a
formação anterior do profissional mais longe estará este do paradigma médico
chinês.
O
grande problema é que instalando uma Medicina Chinesa no ambiente público, como
atendimento no SUS, estes profissionais serão cobrados para mostrar resultados
com a Medicina Chinesa como aqueles preconizados em ambientes chineses
registrados pela OMS. Será que os profissionais de MTC têm hoje a formação
adequada para atender pacientes acamados, crônicos com diversas co-morbidades
em ambiente do SUS independente se este profissional tenha a formação ocidental
em medicina, fisioterapia, biomedicina, odontologia e outros? Os cursos
atualmente formam, em sua maioria, com conhecimentos superficiais em clinica
médica em MTC para ser suficiente o praticante começar a atender em clínicas ou
em ambulatórios onde o paciente chega com acometimentos, em geral, sem grande
gravidade. Para atender pacientes graves com a Medicina Chinesa é fundamental
obter uma formação profunda em semiologia, propedêutica, diferenciação de
síndromes e clínica médica em Medicina Chinesa. Caso contrário a MTC será
utilizada apenas como método secundário/complementar como é utilizada hoje em
muitos hospitais. Muito deste uso apenas como complementar vem da deficiência
do profissional em dados de formação que citei anteriormente.
Então
devemos nos ater ao mesmo tempo em elaborar planos para a implantação da
MTC/Acupuntura no SUS e regulamentação da profissão, mas, ao mesmo tempo,
buscar mecanismos para uma formação acadêmica adequada pois todos nós
precisamos melhorar para chegar a um nível de excelência para oferecer em
ambiente do SUS uma medicina chinesa capaz de atender a uma demanda com
qualidade permitindo ser uma terapêutica fundamental e não apenas alternativa
ou complementar, mas sim, INTEGRATIVA.
Uma
sugestão para fortalecer o conhecimento da profunda clínica médica em Medicina
Chinesa é fazer parcerias institucionais sérias entre Universidades brasileiras
e Chinesas fazendo intercâmbios de alunos e professores fiscalizados pelo
governo brasileiro e chinês no nível da graduação e pós-graduação. Desenvolver
projetos lato sensu de especialização e stricto sensu de mestrados e doutorados
entre as universidades chinesas e brasileiras com certificação válida em ambos
os ambientes acadêmicos dos países em questão. Facilitaria ter alunos e
professores que pudessem se comunicar em mandarim e português sendo esta
qualificação oferecida em ambas as
universidades chinesas e brasileiras. As parcerias que são feitas hoje não têm
fiscalização dos governos e são com fins comercias, em sua maioria, sem grande
objetividade acadêmica e sem validação dos certificados nem na China nem no
Brasil para o meio acadêmico. Todos voltam contentes por ter conhecido a China
(sua muralha, templos, cidade proibida, etc) e terem visto algo da MTC in locu,
mas com conhecimentos pífios na bagagem em termos de MTC de verdade.
Percebo que é
comum em todos os eventos que tenho participado nos últimos anos,
principalmente congressos de Medicina Tradicional Chinesa (MTC) na própria
China, a participação de várias instituições internacionais de MTC, a
Organização Mundial de Saúde (OMS) e as maiores universidades chinesas de MTC
como as de Beijing, Shanghai, Yunnan, Guangdong, Chengdu, Nanjing, dentre
outras. Todos discutindo as diretrizes da expansão da MTC pelo mundo. Há uma
necessidade intensa e real que esta terapêutica siga seu rumo de crescimento
para apoiar a saúde em todo o mundo. É necessário agir eficazmente no
tratamento das patologias crônicas para a saúde impactando também a economia no
mundo moderno. Apesar de conceitos antigos a MTC é a medicina mais atual em
termos de atender as necessidades fundamentais de uma nova sociedade que clama
e traz os conceitos de uma saúde mais abrangente bio-psico-social, onde o homem
transforma o meio e é transformado por este também expandindo este conceito
para a saúde e bem estar, como sua meta de atuação para o século XXI e
vindouros. A MTC traz em seu conteúdo uma experiência riquíssima de pelo menos
5.000 anos de história quando vem se desenvolvendo a cada século a passos
largos, mesmo com as invasões estrangeiras na China no século XIX. É ao mesmo
tempo uma Medicina antiga e uma Medicina jovem onde seus fundamentos podem ser
apoiados pela modernidade da física quântica e vibracional e por pesquisas
mostrando sua eficácia terapêutica e conceitual, ao mesmo tempo apoiadas pela
filosofia milenar chinesa para além dos preconceitos de um novo paradigma e a
pressão do lobby político e econômico da Medicina Ocidental e indústria
farmacêutica. Uma das grandes discussões sempre feita em congressos mundiais de
MTC é sobre a formação profissional adequada, dentro e fora da China, pois com
o desenvolvimento desordenado em cada país, na China se reordenou pós 1950,
muito do conhecimento genuíno, a Medicina Chinesa Clássica, ficou para traz ou
por não conseguir ler em chinês nem ter mestres para interpretá-los
adequadamente, por interesse comercial de cursos de formação e entidades de
classes de saúde, muitos livros e citações foram deturpadas e reconstruídas sob
a luz do paradigma ocidental, pois era mais fácil para todos.
Criaram-se termos
absurdos como “acupuntura médica”, tentativa separatista, que é uma dissidência
dos caminhos da verdadeira acupuntura com diagnóstico nosológico da Medicina
ocidental fato que nunca aconteceu na China com a Medicina Chinesa Clássica. A
Medicina Chinesa necessita de diagnóstico da Medicina Chinesa; A Medicina Ocidental
necessita de diagnóstico nosológico da Medicina Ocidental. Sempre será assim
para que estas medicinas floresçam em sua plenitude devem respeitar seus
paradigmas. É muita pretensão e desrespeito praticamente ignorar o diagnóstico
médico chinês, que funciona há 5.000 anos sem grande tecnologia, para acreditar
que se deve ter diagnóstico ocidental nas práticas chinesas; absurdo. Além de
inconsistente é uma prática utilizada para gerar espaço profissional para um
grupo de profissionais de saúde, conselho de Medicina ocidental, com seu
mercado comprometido por insuficiência de resultados nas patologias crônicas, que
são grande foco de tratamento pela OMS; Simplesmente querem uma reserva de
mercado. É importante compreender que a Medicina convencional ocidental tem um
papel fundamental na saúde e, pelo seu conceitual, sempre será insubstituível
em um evento agudo e outros quadros específicos, mas a MTC tem um grande espaço
no tratamento global e em eventos crônicos e há grande demanda e necessidade no
mundo atual para esta medicina. Para o real crescimento da MTC precisamos
reaprender e re-ensinar profundamente os fundamentos médicos chineses, aprender
a filosofia e o idioma se possível, chegar mais perto de sua cultura e entender
seus paradigmas. Apesar de termos que promover, sem dúvidas, alguma
modernização cuidadosa para adequar à cultura mundial atual. Este tópico
discutiremos em outra oportunidade.
Como a
maioria dos profissionais ocidentais não têm acesso aos textos chineses traduzi
aqui a seguir alguns trechos do Dr. Shang Li da Universidade de Shanghai,
grande mestre, do texto “Guia de Cultura da Medicina Tradicional Chinesa” 中医文化导读 (Zhongyi
Wenhua Daodu) para fortalecer nossos conhecimentos.
A Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e a
Medicina Ocidental (MO) são duas diferentes modalidades terapêuticas com
diferentes bagagens históricas e culturais.
A MTC se origina
da sociedade antiga chinesa tão bem quanto o pensamento acadêmico antigo chinês,
e, portanto recai na categoria de ciência oriental e tradicional. A Medicina Ocidental, contudo, se origina da
ciência ocidental moderna e contemporânea e associa de forma contundente com
epistemologia e ciência assim como progresso tecnológico desde o Renascimento Europeu
dos séculos XV e XVI. A grande diferença entre a filosofia chinesa e ocidental
está na visão de mundo e na metodologia de pesquisa onde se apoiam a MTC e a
MO. Por isso a visão extremamente diferente entre a saúde e a doença,
especificamente da vida, diagnóstico clínico, plano de tratamento,
fundamentação teórica para a educação acadêmica e como conduzir as pesquisas de
sua eficácia.
Isto tudo traz
uma significante perspectiva para a saúde humana e desenvolvimento médico para
que a humanidade possa se beneficiar das diferentes características e como
consequência absorver as vantagens e limitações de cada medicina na construção
da medicina do século XXI.
A MTC tem como
base a Cultura Tradicional Chinesa (CTC) e explica todos os processos
fisiológicos e patológicos sob a visão da antiga filosofia utilizando-se do
Taoísmo, Confucionismo, Yi Jing (Livro das Mutações) e mais tarde o pensamento
Budista gerando as teorias do Yuan Qi (Energia Primordial), Yin-Yang e cinco
movimentos (A retração do metal, a descendência da água, a expansão da madeira,
a ascendência do fogo e a nutrição da terra).
Como explica o professor Shang Li da Universidade de Medicina Tradicional
Chinesa de Shanghai: Lidera a visão antiga chinesa a teoria do Yuan Qi (元气), Qi primordial, que mostra que a origem do cosmos é uma
entidade simples e inseparável (Caos) como a citação “O primeiro aspecto era o
Caos, o Yuan Qi começa a separar o Céu e a Terra” (de “Lun Heng – Tan Tian” um
capítulo de um livro escrito por Wang Chong da dinastia Han oriental), e “O
Yuan Qi constitui o Caos” (de Wen Xuan – Qi Fa” outro livro antigo). Hoje em
dia as teorias incluem os quatro aspectos seguintes: Primeiro de tudo, Qi é
a origem de tudo no Universo, como a citação “Yuan Qi é a raiz de tudo na Terra e o Qi existia antes da separação do
Céu e da Terra” (de “Chun Qiu Fan Lu – Yu Ying” um capítulo de um livro
escrito por Dong Zhongshu da dinastia Han ocidental). Em segundo, Qi é
um tipo de substância em constante movimento, o qual é explicado como “Quando o Qi inicia, coisas começam a
transformar e produzir; quando o Qi move, coisas começam a crescer, quando o Qi
se expande, coisas começam a reproduzir, e quando o Qi acaba, coisas começam a
morrer” (de Su Wen – Wu Chang Zheng Da Lun” um capítulo do Huangdi Nei Jing).
Em terceiro, Qi é a essência que conecta o fenômeno, explicado por “O Qi conecta todas as atividades na Terra”
(de “Zhu Zi Yu Lei” terceiro volume de um livro escrito por Zhu Xi da dinastia
Song). E finalmente, Qi é um meio de indução mútua,
explicada em “Coisas com a mesma natureza
podem conectar ou induzir uma as outras” (de Lun Heng – Ou Hui” um capítulo
de um livro escrito por Wang Chong da dinastia Han oriental).
O professor Shang Li continua
sua aula explicando que o Yin e Yang (阴阳) é um
conceito da filosofia antiga chinesa. Originalmente Yin e Yang eram usados para
se referir a coisas em frente ou contra o sol, mais especificamente, aquilo que
estava a favor do sol é considerado Yang e o que estava contra o sol, na
sombra, é Yin. Gradualmente Yin e Yang foram usados para representar dois
aspectos de oposição, consumo, suporte e interdependência existente em todas as
coisas do Universo. Segundo Lao Zi (que escreveu o livro Dao De Jing e é
considerado fundador do Taoísmo) disse que “tudo
no universo abraça o Yang e carrega o Yin nas costas” mostrando os aspectos
opostos: costas e frente. Acredita-se que a teoria Yin Yang é o fundamento
inerente para as mudanças no mundo, quando o Yin Yang se interagem fazem o
mundo produzir, desenvolver e mudar. O Yi Zhuang (livro que explica o Yi Jing)
afirma que “a reação entre um Yin e um
Yang é chamado de Dao”. O “Su Wen – Yin Yang Yin Xiang Da Lun (o quinto
capítulo do Su Wen)” também afirma que “Yin
Yang são a origem da mudança e transformação de tudo na Terra”.
As
teorias do Yuan Qi e Yin Yang estão bem conectadas na antiga filosofia chinesa.
O Zhou Yi – Xi Ci Shang (um capítulo do Yi Jing), afirma que “o Tai Ji (太极) é a
origem do mundo e mais tarde produziu duas partes segregadas”. Aqui “Tai
Ji” se refere ao Caos sem forma, e “duas partes segregadas” se referem ao Yin
Yang.
A
unificação do Yuan Qi, Energia primordial, contém as polarizações Yin Yang
enquanto as mudanças Yin Yang são o poder inerente do movimento do Yuan Qi.
A
teoria dos cinco movimentos/elementos, Wu Xing (五行) faz parte também da filosofia antiga. O “Shang Shu – Hong
Fan” (um famoso livro da dinastia Zhou) afirma que “os cinco elementos incluem a Água, Fogo, Madeira, Metal e Terra. A
característica da Água é umedecer e fluir para baixo, do Fogo é aquecer e
flamejar para cima, da Madeira é crescer, se expandir e florescer, o Metal se
caracteriza por limpar e mudar, e a Terra dar nascimento a todas as coisas pelo
plantio e colheita. A umidade e fluxo em descendência gera o sabor salgado; o
aquecer e flamejar para cima gera o sabor amargo; o crescimento, expansão e
florescimento gera o sabor azedo; a transformação fácil gera sabor picante e o
plantar e colher gera o doce”. Acredita-se que tudo que é manifesto na
Terra pode ser expresso dentro dos cinco aspectos da filosofia do Wu Xing, as
quais são todas conectadas através da ordem inerente e as relações de
inter-promoção e inter-ação. As teoria do Yin Yang e dos cinco elementos são as
maneiras pelas quais os chineses compreendem os fenômenos naturais.
Com o guiar
deste pensamento filosófico o povo antigo chinês acredita que a Terra é um
mundo holístico e em constante transformação. Que tudo se interage e está
conectado, e que todas as coisas na Terra tem sua origem antes da separação do
Caos pelo Yuan Qi, espontaneamente produz e transforma pelo seguimento da lei
inerente da mudança Yi (易) -teoria oriunda do livro Yi Jing- proveniente
do Yin Yang e cinco movimentos/elementos. Em suma, a totalidade orgânica é
inseparável.
Por
tudo isso as características fundamentais da Medicina Tradicional Chinesa (MTC)
passa pela “diferenciação de síndromes” ao invés de tratar doenças como a
Medicina Ocidental, assim como está solidificada pela percepção da “integração
Mente-Corpo”. Estes fundamentos podem ser explicados segundo o professor Shang
li da seguinte forma:
1) É
considerado sob o ponto de vista da MTC que os Seres Humanos não são somente “humanos”
em significado biológico, mas também um todo orgânico envolvendo “integração
céu-homem”, “integração mente-corpo” e “integração natureza-homem”. Enquanto a
unidade entre o homem e o Universo é tida como muito importante, o Céu e a
Terra são grandes sistemas e o homem é um pequeno sistema. O Micro e o Macro
são regidos pelas mesmas leis e são inseparáveis. O nascimento, envelhecimento,
adoecimento e morte do homem corresponde à lei da mudança Yi do Céu e da Terra,
a saúde ou a doença humana estão associadas com as mudanças Yi da natureza e da
sociedade. Atualmente “homem”, pequeno sistema entre o Céu e a Terra também é
uma unidade. Céu-Homem-Terra. Cada parte do corpo mantém sua própria função
estável através de ação mútua. Qualquer parte ou área só faz sentido quando
integrada e entendida como um corpo todo. Desta forma áreas locais são
compreendidas como um todo e podem expressar a condição de todo o organismo. Os
órgão e vísceras, conhecidos como sistema Zang-fu (脏腑) na MTC, são conectados uns aos outros em estrutura. Por um lado
eles são interdependentes e interagem entre si. Por outro lado estes também
podem ser afetados patologicamente pelo outro. O homem é considerado como “a
função (yang), a estrutura (yin)” e o estado metabólico de um todo orgânico não
podem ser representados somente por um órgão, uma célula ou um gen. Cada
indivíduo é uma síntese que consiste de seu único Qi e Sangue Xue, Zang-fu,
meridianos, líquidos orgânicos, ossos, músculos e pele, e uma parte nunca é o
todo apesar de poder refletir o todo.
2)
O mundo e todas as coisas na Terra estão em
constante movimento e mudança durante todo tempo. “A única coisa que não muda é que tudo muda”. Isto impacta a vida
humana. Isto foi explanado em “Ge Zhi Yu Lun – Xiang Huo Lun” (um capítulo em
fogo ministerial sobre a propriedade das coisas escrito Zhu Danxi). O termo
médico chinês “síndrome da doença”, Mei ni er shi zheng (美尼尔氏症), refere-se a um completo estado funcional mórbido resultante de
fatores desequilibrantes internos e externos os quais podem se transformar com
a progressão e mudança na condição da doença. Leva-se sempre em conta a
capacidade antipatogênica do indivíduo ou Qi correto, chamada Zheng Qi (正气) Subsequentemente o termo “diferenciação de síndromes” é útil para
clarear sobre o estado de saúde e doença proveniente de uma visão dinâmica.
3) É
enfatizada no modelo “integração corpo-mente” que o homem é considerado como
uma unidade com coordenação perfeita fisiológica-psicológica, e que a natureza
social pode ter grande impacto na mente e no corpo do homem. Consequentemente a
MTC propõe um relacionamento mútuo entre mudanças emocionais e
fisiologia/patologia. Por exemplo, de acordo com a MTC a emoção do Fígado Gan é
a raiva e esta pode lesionar a energia Qi do Fígado. Baseado neste ponto de
vista, a terapia de regulação mente-coração Xin, foi criada para prevenir e
tratar doenças, o qual pode ser mostrado no “Ling Shu – Shi Chuan” no capítulo
29 do Ling Shu como “é humano temer a
morte e ter esperança na sobrevivência, então se o profissional de saúde
explica as condições da doença para o paciente de uma boa maneira... mesmo os
pacientes mais complicados podem cooperar”.
Há uma
grande diferença de entendimento do corpo humano entre a ciência médica chinesa
e ocidental. De acordo com o sistema de ciência ocidental, o mundo é uma
síntese de substancialidade no qual se enfatiza mais entidades tangíveis e
substâncias. Portanto a ciência ocidental mantém que a natureza e a lei de
todas as coisas que existem são apenas a relação entre entidades, e a lei é
escondida por trás do fenômeno errático. O Espaço
é considerado o padrão na Medicina Ocidental. Segundo o professor Dr. Shang Li
da Universidade de Medicina Tradicional Chinesa de Shanghai.
De
acordo ao sistema de ciência oriental o mundo é o produto da transformação do
Qi, a qual dá mais importância à entidade natural e original, manifestando como
processo entre o fenômeno e a natureza e enfatizando em conexão da função e
informação. O Tempo é considerado o
padrão na MTC.
MTC e
MO desenvolveram ao longo do tempo suas respectivas rotas e formaram diferentes
ângulos de observação; MTC presta mais atenção para a relação funcional e MO
presta mais atenção a estrutura da substância.; MTC foca na “diferenciação
sindrômica” e a MO foca no “tratamento de doenças”. Lembrando que “Síndrome”
neste conceito chinês é muito mais que um conjunto de sinais e sintomas mas,
principalmente, é a percepção da capacidade inerente do indivíduo de se manter
saudável, O Qi correto, Zheng Qi.
Segundo
ainda o professor Shang Li há grandes vantagens e desenvolvimento potencial da
Medicina Tradicional Chinesa. A despeito do status atual da Medicina Ocidental
no mundo, a Medicina Tradicional Chinesa com seus 5.000 anos de história, ainda
tem desenvolvimento potencial na teoria e é gradualmente reconhecida pelo mundo
por causa de seus diagnósticos e tratamento únicos tão bem quanto sua grande
eficácia terapêutica. Forte estatística mostrou que há agora mais de 50.000
instituições de Medicina Chinesa (a grande maioria acupuntura) espalhadas em
mais de 130 países do mundo, mais que 100.000 acupunturistas ligados a estas
instituições (o que se supõe número muito maior de acupunturistas não ligados a
estas instituições) e mais de 20.000 praticantes da Medicina Chinesa fora da
China dados de 2007. Em adição a isto a cada ano cresce cerca de 30% de
cidadãos nestes países que usam a Medicina Tradicional Chinesa e quase 80% do
povo chinês recebe terapias da MTC continuadamente. Focada no “modelo
biomédico” a Medicina Ocidental está diante de crescente limitação em seu
desenvolvimento. A Medicina Tradicional Chinesa focada no “modelo médico de
atividade vital integral”, observação dinâmica e integração corpo-mente, está
mais adaptada para o futuro modelo médico “bio-psico-social” e multidisciplinar
cada vez mais forte na construção da Medicina do século XXI pela Organização
Mundial de Saúde (OMS).
Começando pelo entendimento das funções gerais do corpo
a MTC provê o desenvolvimento de uma “nova” fonte com tal conhecimento original
envolvendo fenômenos da vida como Meridianos e Qigong e estados específicos
fisiológicos e patológicos. Tão logo o tratamento seja prescrito a MTC trata o
homem holístico, enfatiza a diferença individual e o momento funcional das
mudanças e definido o diagnóstico personalizado e sistema terapêutico com
considerações das diferenças individuais, tempo e espaço para evoluir a
habilidade de auto-defesa e coordenar e restabelecer a capacidade inerente de
manter-se saudável, a força anti-patogênica, o Qi correto. Com o princípio de
tratamento “tratando a raiz”, a causa
do adoecimento e não a doença, a MTC é muito mais apropriada para tratar
patologias crônicas tais como doenças imunes, doenças cardiovasculares e
desordens metabólicas, além de ser capaz de regular a “sub-saúde” como a
síndrome da fadiga crônica. As terapias internas e externas da MTC incluem a Farmaco-fitoterapia
chinesa, Acupuntura, Tuina, Qigong e Terapia dietética. Além de grandes efeitos
terapêuticos estas terapias podem também evitar a toxidade ou efeitos
colaterais das drogas químicas. O sinólogo alemão Porkert disse uma vez que “a MTC funciona maravilhosamente bem no
diagnóstico e tratamento de patologias crônicas, além de poder fazer um acurado
e específico julgamento em desordens funcionais individualizadas e curá-las. A
Medicina Ocidental não pode fazer isto nem de longe”.
Este
modelo terapêutico é o ponto forte da MTC o que a capacita entender situações
de uma forma compreensiva e holística levando a tratar algumas doenças
intratáveis pela MO com etiologia obscura e obter excelentes resultados.
Precisamos
ampliar o horizonte e entender que mais do que nunca precisamos, além da
Medicina Convencional ocidental e suas diversas classes de saúde, da Medicina
Tradicional Chinesa e suas terapêuticas, e incluir terapêuticas de bases
integrativas de grande relevância como a homeopatia, Práticas da Meditação,
Práticas energéticas, a Medicina Quântica desde que todas tenham um rigoroso
sistema de ensino e educação para a formação de profissionais realmente capazes
de desempenhar com efetividade tais terapêuticas.
É tão
importante lutarmos para a legitimação destas terapêuticas como profissões
reconhecidas quanto formarmos bases sólidas para estruturarmos a adequada
educação profissional para a necessidade de construção deste novo modelo de saúde para o mundo atual.